segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Imparcial parcialidade

A linguagem foi uma das maneiras encontradas pelos seres para estabelecer comunicação. Utilizada a todo e qualquer instante, seja para trabalhar, estudar, negociar, planejar, fazer rir ou chorar, informar ou se fazer entender - ou pelo menos tentar - a linguagem é fundamentalmente usada com propósitos sociais. As línguas simplesmente não existiriam se não fossem as atividades sociais das quais elas são instrumento.
O uso da linguagem, seja ela escrita, falada, sinalizada ou gestual, é uma forma de ação conjunta, que surge quando locutores e co-locutores desempenham suas ações de maneiras individuais, porém coordenadas entre si de alguma forma. Assim sendo, podemos dizer que a linguagem incorpora processos individuais, bem como processos sociais pois, falantes, escritores, ouvintes ou leitores devem executar suas ações na condição de indivíduos, se quiserem obter sucesso no uso do mecanismo linguístico, trabalhando juntos como unidades sociais.
Na linguagem humana, os significados só podem ser totalmente compreendidos se analisarmos contexto e interlocutores. Se partirmos do pressuposto de que para haver de fato a comunicação através da linguagem, e que esta depende conjuntamente de ambas as partes individualmente, concluímos que se uma das partes não executar adequadamente seu papel, a comunicação apresentará falha. 
Mas como pode uma das partes não cumprir adequadamente o seu papel?
Antes de respondermos, vamos falar um pouquinho sobre Marshall McLuhan, um dos maiores teóricos da comunicação.
Um dos mais famosos conceitos de McLuhan é o de "aldeia global". Em seu livro O meio é a mensagem, ele afirma que "a nova interdependência eletrônica cria o mundo à imagem de uma aldeia global". Quando ele falou isso, a coisa mais parecida com internet que existia eram as redes de computadores militares norte-americanas. Computador pessoal era apenas um sonho distante. McLuhan falava basicamente da influência da televisão (instrumento inovador na época) na comunicação de massa.
A evolução tecnológica deixa, aqui, de ser mera coadjuvante na vida social: o que é dito é condicionado pela maneira como se diz. O próprio meio passou a ser a principal atração, a informação. Muitas das páginas que estão na internet, por exemplo, poderiam ser livros ou revistas, mas, segundo McLuhan, tornam-se interessantes justamente porque estão em um novo meio de comunicação.
Segundo ele - guardem bem essa frase - "Poucos estudantes conseguem adquirir proficiência na análise de um jornal. Ainda menos têm capacidade para discutir com inteligência um filme."
Uma das mais curiosas idéias de McLuhan é a de que "os meios de comunicação são extensões do homem". Assim como se usa uma pinça para aumentar a precisão das mãos e uma chave de fenda para girar um parafuso, os meios de comunicação seriam, na verdade, extensões dos sentidos do homem. Os óculos, por exemplo, são extensões do olho, a roupa é uma extensão da pele, a roda do carro é uma extensão do pé. 
Estamos aqui chegando à resposta da nossa pergunta anterior.
Se o meios são extensões do homem como propôs McLuhan, como poderiam eles serem meros transmissores de mensagens imparciais?
O fenômeno de concentração da imprensa nas mãos do poder político e econômico converteu-se em uma realidade inegável. Em geral, os meios informativos, vinculados ao poder do dinheiro e que defendem a ordem estabelecida, são confrontados pelo desafio da imparcialidade, nunca alcançada ou sequer desejada.
Nada que vemos em um jornal, internet, revista ou TV, foi ali inocentemente publicado.
É fato e é regra que uma reportagem ou notícia ouça todos os lados envolvidos, isso é o que dará um considerável grau de “imparcialidade” a essa produção. O jornalista é antes de tudo um ser humano, tem suas convicções e seus signos pessoais que sempre irão influenciar sua visão do fato, é também funcionário ou autor de um veiculo – se freelancer produz já pensando a que veículo enviará sua produção – e cada veículo tem sua “linha editorial” ou sua orientação bem definida do que quer “vender”, de qual é realmente seu "produto".
Então onde está a imparcialidade?
Apurar um fato já conta como um ato de parcialidade. Escolhemos a fonte que acreditamos ser a melhor, os ângulos que pensamos serem os mais próprios, a pauta que imaginamos interessar o leitor. Quando escrevemos, colocamos em nossos leads o que achamos mais importante ou interessante. A decisão é do jornalista e não do fato.
Marshall McLuhan
Então, quando nos deparamos com uma notícia sobre uma obra social amparada por um político, uma excentricidade de um famoso ou um prognóstico sobre as novas composições familiares na sociedade, devemos antes questionarmos os reais motivos para tais coisas terem sido publicadas em detrimento de outras. Não se enganem! Nenhum meio de comunicação publica coisas como fotos de casamento gays entre artistas porque acha bonitinho ou politicamente correto. Eles preocupam-se em vender, em publicar algo que as pessoas queiram ver e paguem para isso.
Então voltamos novamente a nossa pergunta anterior: Mas como pode uma das partes não cumprir adequadamente o seu papel?
Simples, quando o poder e o dinheiro vem em primeiro lugar, na garupa de uma sociedade sem proficiência na análise de um jornal e sem capacidade para discutir com inteligência pelo menos um filme.
McLuhan nunca esteve tão certo.

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