Às vezes é preciso que algo aconteça em nossas vidas para que surjam reflexões valorosas.
A ocasião não poderia ser mais funesta: um velório. Mas tal acontecimento acabou por desencadear mil e um questionamentos.
Já pararam para pensar que realmente existe uma força inexplicável que nos move, nos impulsiona nessa aventura da vida?
Sem ela, não passamos de um corpo inerte, matéria inanimada.
Alguns podem chamá-la alma, outros, espírito. Os mais céticos buscam na metafísica e nas demais ciências explicações.
Nada é concreto. Continuamos vivendo e morrendo, sem entender realmente o que somos: se apenas um aglomerado de átomos, uma mutação dos macacos ou um sopro divino.
Aliás, aí está o adjetivo correto: Divino. A real divindade está em cada ser, em cada criatura existente. A iconografia e idolatria deveriam fazer referências claras ao ser que habita em todos os seres. Talvez só no caso dos mártires, santos e personalidades ilustres é que vislumbramos essa força invisível que nos impulsiona. Declaramos admirar a força, a coragem, a disposição destes indivíduos, ao passo que esquecemos das nossas próprias qualidades. A raiz destes “antolhos” é um dos grandes segredos da humanidade. Entender o porquê disso é outra coisa.
Voltando ao ponto.
A ideia da morte sempre assombrou. Uma vez que atrelada a ela sempre vemos a ideia de fim, extinção.
E se não fosse assim?
E se vivêssemos um dia de cada vez?
E se vivêssemos cada ato em sua plenitude, sem aquela preocupação obsessiva com o futuro?
Sabe, mais ou menos, aquela coisa de escovar os dentes realmente escovando os dentes, verificando a retirada dos resíduos, a textura, o brilho do esmalte. Mas cotidianamente, escovamos os dentes pensando no ônibus que teremos que pegar, nas coisas que teremos que comprar no supermercado, nas tarefas que serão desenvolvidas no trabalho. Enfim, pensamos em tudo, menos no que estamos fazendo. Nos preocuparmos com o que ainda nem aconteceu. Isso nos remete àquela ideia anteriormente debatida: a efemeridade de todas as coisas.
Voltando ao ponto exato de acabar: a morte.
Assunto muito controverso, já foi inspiração para muitos escritores, pensadores, intelectuais. Porém nenhum transmitiu com mais maestria a essência deste tema do que o francês Victor Hugo. Em seu livro “Lês Tables Tournantes de Jersey”, o autor fala sobre uma ideia de morte um tanto quanto diferente daquela que estamos acostumados:
Ela não é senão o fim de uma coisa e o começo de outra.
Na morte o homem acaba e a alma começa.
Eu sou uma alma.
Bem sinto que o que darei ao túmulo não é o meu eu, o meu ser.
O que constitui o meu eu, irá além.(...)”
E não é só isso.
Em outras obras – Os miseráveis – o autor percorre o universo da transmutação das relações humanas, alinhavando as ações e percalços de seus personagens, sob um pano de fundo comum: a efemeridade de todas as coisas.
Desde de criança a morte sempre foi uma ideia difícil de me acostumar, algo que deixa no meu intimo uma sensação não só de vazio, mas principalmente de injustiça.
Então criei uma espécie de metáfora para ela.
Para mim, a morte é como um grande navio, onde as pessoas que embarcam ficam o resto de suas existências atravessando os mares, em um interminável cruzeiro de volta ao mundo. Na minha nau coloquei meus bisavós, avós, tios, primos, amigos, colegas de colégio, vizinhos, meus animais de estimação e, com uma dor infinita, uma filha. Gosto de imaginá-los juntos, confraternizando, sorrindo e felizes. Assim, sem sofrimento, sem dor. Isso apazígua um pouco o meu coração.
Acredito que cada pessoa é capaz de encontrar uma maneira de lhe dar com a morte.
E creiam: o tempo realmente é um grande remédio. Ele não irá curar a dor, mas fará com que ela se transforme em algo menos sofrido. Não é capaz de plantar o esquecimento, mas coloca em nossos caminhos outras coisas, outros acontecimentos, outros obstáculos. Distrações que acabam por fazer com que apenas as boas lembranças, os bons momentos pareçam ser relevantes.
Talvez seja difícil encontrar esse ponto, esse sutil equilíbrio. Talvez, na pior das hipóteses, nunca se encontre. Mas, se serve de algum consolo, a vida nos impele, nos empurra para frente, independentemente da nossa vontade.
No fundo, no fundo, tudo isso advém de nada mais nada menos do que sentimentos, emoções, momentos...
Nada que a razão possa explicar.
Ideias sobre a morte, sobre o fim, sobre o futuro.
Ideias sobre a vida, sobre obstáculos, sobre mistérios.
*Dedico esse texto a todos aqueles que já perderam um ente amado, especialmente as minhas amigas Lorena, Lisa e Marina.
2 comentários:
Que tenhas um grande grande 2010 com tudo que desejas!
Toma um beijinho.
Ótimo texto, Bárbara.
'Desde sempre o homem procurou acreditar em um Deus. Ter fé é como ter um coringa; é sorte e um privilégio. Os homens sempre foram em busca de um Deus, seja em Cristo ou venerando o Sol, a Lua, enfim, a vários elementos onde um ser superior pudesse ser representado com grandeza e perfeição para atenuar nosso ‘morrer’ ou nossa ‘passagem’. O ser humano sempre precisou acreditar na perpetuação da vida através do espírito. Não importando o caminho. Confesso que eu ainda não sei de nada, até gostaria de acreditar em algo...'
Deixo um link de uma crônica minha, gostaria que desses uma lida.
http://taisluso.blogspot.com/2007/10/nossos-velhos.html
meu carinho, amiga.
tais luso
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