As eleições municipais já passaram. Ficou apenas um rastro de inconformidade e decepção da Direita Conservadora afinal, o resultado desse pleito ficou muito aquém do que se esperava. Muitos culparam o TSE, outros as urnas e há quem culpe os eleitores que se abstiveram de votar. Mas você realmente sabe quais os reais motivos para termos eleito tão poucos vereadores conservadores no Brasil? Desenrolamos esse novelo.
Sistema Político X Sistema Eleitoral
Qual o sistema eleitoral do Brasil?
Democracia?
Não!
Muita gente confunde isso. Democracia não é sistema eleitoral, mas sim um tipo de governo, onde o povo exerce sua vontade soberana, direta ou indiretamente. Já o Sistema eleitoral é um método de escolha de alocação das cadeiras do Legislativo de acordo com o número de entrada de votos.
Existem vários sistemas eleitorais, sendo os mais conhecidos:
1- Saint-Lagüe
2- Quota de Hare
3- Jefferson
4- D´hondt
5- Huntington
6- Schulze
7- Condorcet
8- Webster
Quociente Eleitoral
Todo mundo já ouviu falar no tal quociente eleitoral. Mas, alguém já procurou saber como funciona? Vamos fazer uma explicação, o mais simples possível, para que você possa entender. Antes de mais nada, deixo bem claro que detalhes irrelevantes para a explicação foram deixados de lado e a lógica matématica foi abreviada. O objetivo aqui não é ficar discutindo fórmulas matemáticas e detalhes técnicos, que não somarão em nada ao entendimento da maioria.
Bem, de maneira geral, no Brasil temos eleições para o Executivo e Legislativo. Há países em que os membros do Judiciário também são eleitos por voto popular, mas infelizmente não é o nosso caso.
Temos dois tipos de eleição:
1- Majoritária
2- Proporcional.
Os chefes do Executivo (prefeitos, governadores e o presidente) são eleitos pelo método majoritário, em que, simplesmente, se verifica quem teve mais votos. Já no Legislativo, as coisas mudam. Os Senadores são eleitos através do método majoritário, mas os vereadores, deputados estaduais e federais são eleitos pelo método proporcional.
Como funciona esse método proporcional
A eleição pelo sistema proporcional brasileiro é a combinação de dois métodos matemáticos, o de d'Hondt e o de Jefferson, que já listamos para vocês no começo desse post. A combinação destes métodos fazem com que seja levado em consideração não apenas o voto que o candidato obteve, mas também o número total de votos que o partido recebeu. Ou seja, a ideia é prestigiar a força da representatividade do voto tanto ao candidato como ao partido.
Inicialmente, aplica-se o método Jefferson, que determina que o número de cadeiras obtidas por cada partido corresponde ao seu quociente partidário. Mas, como se chega a esse quociente?
Pode parecer difícil, ainda mais para pessoas que, como eu, não tem a Matemática como ponto forte, mas dá para chegar lá. Para se chegar ao quociente partidário, é preciso, antes, calcular o quociente eleitoral. Vamos fazer passo a passo.
Calculando o Quociente Eleitoral
O quociente eleitoral é obtido da divisão do número dos votos válidos totais pelo número de cadeiras (Qe=Vválidos totais/Cadeiras). Vamos pegar como exemplo a cidade de São Paulo, onde a Câmara de Vereadores possui 55 cadeiras.
Agora, digamos que num determinado pleito foram registrados 550.000 votos válidos no total para vereadores (isso contando todos os votos da população, independentemente de partido ou candidato). Aplicaremos então a matemática, dividindo os votos válidos (550.000) por 55 cadeiras da Câmara. Assim obteremos o quociente que será 10.000.
Quociente partidário
Mas a coisa não acaba aí. Precisamos também saber qual o quociente partidário.
O quociente partidário é o resultado da divisão dos votos totais que o partido ou coligação receberam pelo quociente eleitoral (Qp=Vpartido/Qe), independentemente, de quantos votos foram para um ou para outro candidato.
Então, imaginemos que na eleição tenhamos apenas 4 partidos ou coligações. Imaginemos que o MDB tenha sido o partido com mais votos em SP e tenha recebido 400.000 votos, independentemente se esses votos estão concentrados em poucos candidatos ou em muitos. Assim, o quociente partidário do MDB será 400.000/10.000, ou seja, será 40.
Sabe o que isso significa? Significa que, independentemente dos votos de qualquer candidato, os 40 mais votados do MDB serão eleitos. Se a seu partido ou sua coligação foi quem recebeu mais votos, o que levou o partido a garantir 40 cadeiras, o número de votos de cada um dos candidatos desse partido (ou coligação vencedora) só vale para se escolher quem serão os 40 candidatos do partido a ocuparem uma cadeira. É por isso que um candidato de um partido forte (ou que tenha algum candidato papa voto) acaba sendo eleito com menos votos do que um candidato de um partido que, no geral, recebeu menos votos.
Para cada partido (ou coligação) será calculado seu quociente partidário e sempre que este for maior do que o quociente eleitoral, ele terá direito a alguma(s) vaga(s) por esse método. No mesmo exemplo, imaginemos que o DEM tenha recebido o segundo maior número total de votos, com 73.000. O coeficiente partidário do DEM será 73.000/10.000 que é 7,3. Quantas cadeiras o DEM ocupará? 7 (arredonda-se, sempre, para baixo). Ou seja, os 7 candidatos mais votados do DEM serão eleitos, independentemente do número de votos de cada um em relação aos demais.
Vamos continuar e imaginar que o PT teve, no total, 59.000. Aplicando nossa fórmula de cálculo de quociente partidário, 59.000 dividido por 10.000 (quoeficiente eleitoral) obteremos é 5,9. Desta forma, o PT, de cara, terá 5 cadeiras. Por fim, imaginemos que o outro único partido que concorreu foi o PRTB, por exemplo, e este obteve 5.000 votos? Ora, 5.000/10.000 é 0,5 e como sempre se arredonda para baixo, de cara, o PRTB não terá direito a cadeira, ainda.
Esclarecido isso, concluímos logo de cara que é mais importante o número total de votos do partido do que o número obtido por um candidato específico. E, como para esse cálculo, vale também as coligações, é sempre interessante para os partidos se juntarem ao máximo, pois, assim, terão mais candidatos e, consequentemente, chances maiores de mais votos.
Mas ok. Complicadinho, mas deu para entender, né? Mas não acabou ainda. Peraí.
Seguindo o nosso exemplo, onde usamos a Câmara de São Paulo e suas 55 cadeiras de Vereadores, vimos que só MDB, DEM, PT garantiram vagas pelo método do quociente partidário (40 + 7 + 5 = 52). Faltam preencher 3 cadeiras.
Como se escolhem os outros candidatos para preencherem as 3 cadeiras restantes?
Método d´Hondt
Para complementar o número de vagas, aplica-se o método d´Hondt. Por esse método, a sobra das cadeiras (leia-se o número de vagas não preenchidas pelo método anterior) será definida através da divisão do número de votos do partido pelo número de cadeiras já conquistadas pelo anterior somado ao número
Difícil de entender? Vamos ver na prática...
A primeira das 3 vagas que restaram será atribuída ao partido que tiver o que a legislação eleitoral chama de “Média” e que se calcula pela divisão do quociente partidário pelas número cadeiras já conquistadas + 1.
Voltemos aos números do nosso exemplo.
A média do MDB será seu quociente partidário (40) dividido pelo número de vagas já conquistadas (40) acrescido do número 1. Ou seja, a Média do MDB será 40/41 que dá 0,975. A média do DEM será seu quociente partidário (7,3) dividido pelo número de vagas já conquistadas (7) acrescido do número 1, 7,3 dividido por 8, obtendo por média 0,9125. A média do PT será seu quociente partidário 5,9 dividido pelo número de vagas conquistadas (5) acrescido do número 1, ou seja, a média do PT será de 5,9 dividido por 6 que dá 0,9833. Por fim, a média do PRTB será seu quociente partidário (0,5) dividido pelo número de cadeiras (0) acrescido do número 1, ou seja, 0.5/1 que dá 0,5.
Observem as médias de todos:
MDB - 0,975
DEM - 0,9125
PT - 0,9833
PRTB - 0,5
Qual a média é maior? A do PT. Então, a primeira das três vagas restantes vai para o PT.
Depois de definida essa vaga, começamos outra rodada de cálculos, tendo em vista que um dos partidos, no caso o PT, aumentou o seu número de cadeiras ocupadas na Câmara.
Segunda Vaga
Para calcular a segunda vaga a ser preenchida, é necessário fazer o mesmo cálculo. Porém apenas, a média do PT vai mudar. A divisão agora será por 9 e não 8 (número de vagas conquistadas + 1). Agora, a média do PT será de 0,8111.
Observem as médias de todos:
MDB - 0,975
DEM - 0,9125
PT - 0,8111
PRTB - 0,5
Assim, entre as 4 médias, a maior será do MDB. Logo, o partido leva a segunda vaga.
Terceira Vaga
Por fim, a terceira e última vaga será calculada da mesma maneira, mas, agora, é a média do MDB que mudou para 0,9523. Mas, mesmo levando a vaga anterior, a média do MDB continua maior e, portanto, o MDB leva a última vaga também.
Observem as médias de todos:
MDB - 0,9523
DEM - 0,9125
PT - 0,8111
PRTB - 0,5
No final das contas, o MDB ficou com 42 vagas, o DEM com 7 e o PT com 6. O PRTB não conseguiu vagas. Agora fica muito mais claro para o eleitor entender que mesmo que o candidato que no qual votou tenha se classificado entre os 20 mais votados, por exemplo, não foi eleito.
Deu para entender? Espero que sim.
Mas por que eu estou mostrando tudo isso agora? Para mostrar para vocês como a Direita tem que aprender a fazer Política com as armas que tem, com o que o próprio sistema nos permite agir. O candidato a vereador conservador Edson Salomão, por exemplo, saiu pelo PRTB e teve 27.000 votos. Não foi eleito. Enquanto isso, Paulo Frange (PTB) foi eleito com 17.796 votos, quase 10.000 votos a menos. Se ele tivesse se filiado ao PTB, teria sido eleito.
Então, caros leitores, fica o esclarecimento: Quem quiser realmente ser eleito e for "direita-raiz” e ficar com frescura de se filiar a um partido maior só porque o partido não é 100% conservador (que fique claro que isso não existe) nunca vai ser eleito. Cairá sempre na armadilha de ter que se esforçar infinitamente mais do que um candidato de partido grande para se eleger e correrá um sério risco de ser apenas um nome lançado, sem efetividade logística para vitória, sem que tenha servido de nada o seu desgaste em campanha.
O que mais se viu nessas eleições foram as declarações de candidatos conservadores dizendo que escolheram o partido por princípios ideológicos! Muitos reproduzindo a sandice de que só o PRTB, hoje, é um partido 100% conservador. Vi vários argumentando isso. Ledo engano. Passado à parte, a verdade é que o PRTB é um partido nanico. E isso influencia muito em tudo que falamos aqui sobre coeficiente e poder de articulação.
Vamos usar novamente São Paulo como exemplo. Lá, o PRTB colocou só 68 candidatos a vereador. O PT colocou 83, sendo que alguns deles são figuras conhecidas que atraem muitos votos, como o Eduardo Suplicy. Observe que quanto mais candidatos fortes, mais chance se tem de alcançar o coeficiente. O erro do PRTB custou caro. A vaga que poderia ter sido preenchida pelo conservador Edson Salomão foi ocupada pelo petista Arselino Tatto, ainda que essa criatura tenha tido apenas 25.021 votos.
Acredito que muito se tem a refletir depois dessa arrasadora derrota. Mas a inocência ideológica não foi o pior que aconteceu nessas eleições. No meu ponto de vista, a pior coisa foi o massacre sofrido pelos ativistas que se arriscaram e fizeram o "dever de casa", planejaram a estratégia para atingir o coeficiente e serem eleitos com poucos votos. Escolheram a legenda com base totalmente calculada, colocando de lado essa balela de "partido 100% conservador". Resultado: Muitos nomes excelentes foram traídos pelos próprios seguidores, tendo como o mero argumento o fato de não estarem em um partido conservador, como se isso existisse no Brasil! Santa ignorância! A Direita precisa entender de uma vez por todas que eleição é antes de tudo, estratégia e matemática, algo que fazendo um torto paralelo, parece com a Bolsa de Valores: você observa não só quem está em alta, mas quem tá na baixa e, principalmente como a soma de ambos podem definir a sua direção.
Quanta oportunidade desperdiçada! Quantas cadeiras poderíamos ter ocupado se a Direita soubesse mesmo o que deveria fazer...
E grave: não foram capazes de entender várias deixas do próprio Presidente Bolsonaro, especialmente aquela em que ele pediu que as pessoas votassem em candidatos que defendessem Deus, Pátria e Família. Nunca, em momento algum, o Presidente disse que votássemos apenas nos candidatos do PRTB ou de outro partido específico. Ele queria que os eleitores entendessem que o importante era votar na pessoa, na liderança conservadora que era referência. Partido no Brasil nunca será referência de nada, seja que sigla for pois não temos histórico de estruturação conservadora na política nacional.
Mas, o povo não entendeu. As pessoas se preocuparam mais em reproduzir os "mi mi mis" hermeticamente fechados, como aquelas bestagens de não usar fundo partidário ou fundo eleitoral se for conservador. Gente! Acordem! Esses "nojinhos" custaram e custam muito caro aos avanços da causa conservadora. Se o recurso é um instrumento legal e legítimo, por que não usar? O eleitor precisa ser esclarecido sobre o que ocorre quando um candidato abre mão desse recurso. Pouquíssimas pessoas sabem onde o dinheiro não usado vai parar. E o resultado é um montão de gente que fica "incensando" o Partido Novo por conta deles defenderem o não uso de fundo partidário, sendo que poucos sabem que eles não podem devolver o dinheiro que recebem aos cofres públicos. Precisamos enterrar essa merda de narrativa.
Agora que a eleição passou, aqueles que não foram eleitos entenderam o que deu errado no caminho. Muitos que confiaram cegamente na narrativa de que o PRTB era um partido "limpinho" e ideologicamente alinhado, nem se quer se deram ao trabalho de pesquisar um pouquinho mais sobre a legenda. Se tivessem feito isso, saberiam que o PRTB fez parte, por exemplo, da coligação que elegeu Camilo Santana, do PT, para o governo do Ceará, em 2014. E isso é só um fragmento. Nem vou mencionar o porquê o próprio Presidente Bolsonaro não apoiou o Levi Fidélix para prefeito de São Paulo.
É essa a Direita que acha que está preparada para o jogo.
Ficou claro que não adianta ter boas intenções e valores honrosos, mas não entender nada do jogo e das engrenagens políticas.
Nas próximas eleições, se alguém quiser a minha ajuda, não que sirva para muita coisa, ajudarei a todos que forem alinhados ideologicamente comigo, conservadores acima de tudo. Só não vale ser um "canhoto", analfabeto político, cheio de frescuras e "não me toques" sem fundamento.
Precisamos ocupar espaços de poder! Precisamos nos espalhar por vários partidos. Precisamos ter lastro e formar base de sustentáculo para o nosso presidente, para o nosso projeto de Brasil. De nada adiantará estarmos entrincheirados em um único partido, seja ele qual for. E lembre-se: muitos usarão o nome do Bolsonaro, "arrotarão" conservadorismo, quando na verdade são lobos em pele de cordeiro, infiltrados e oportunistas, surfistas da onda conservadora.
Ah, e antes que eu me esqueça, pelo amor do Pai, não se deixem levar pelo candidatos "Tutubers", aqueles que espalham sua imagem com videozinhos sensacionalistas em redes sociais e apps de mensagem. Esses são os piores. São os que nenhuma substância tem, nenhum projeto, só sabem se promover mostrando o trabalho do opositor, mas se forem "exprimidos" em um debate ou questionamento, não dão caldo para meia canja.
Saibam discernir!
Entendam que o Bolsonaro se tornou uma máquina de votos e justamente por isso, tenho certeza de que muito em breve estaremos vendo o surgimento de um novo PSL, com todas as mazelas e outras piores. As eleições de 2022 vem aí. A ferocidade dos caciques políticos, aliada à falta total de escrúpulos e o pouquíssimo conhecimento que a maioria do eleitorado tem sobre o sistema eleitoral, colocará novamente os conservadores ajoelhados, endeusando uma outra legenda partidária, seja ela qual for, desde que tenha o Jair Bolsonaro em seu quadro de membros.
As siglas disputarão o Bolsonaro como troféu a ser exibido, um ícone que será explorado ao extremo da razão humana, usado novamente para inflar um outro partido. Pesquisem a legenda para onde o Presidente for, vejam quem são os caciques do seu estado, quem eles apoiaram e apoiam, com quem se juntaram, em que grupos políticos se encaixam. Pesquisem quem realmente defende nossa causa conservadora no seu estado. E tenham certeza de uma coisa muito séria: Político de carreira não quer liderança conservadora concorrendo em eleição. Querem apenas usar os ativistas como massa de manobra, exatamente como os esquerdistas fazem com seus próprios seguidores. Por isso é tão importante que nós eleitores estejamos alertas. Não engulam qualquer nome, surgido do nada, e apresentado como o indicado referenciado. Saibam que isso vai acontecer, indubitavelmente. O poder e os interesses pessoais estarão acima de tudo que defendemos. É contra isso que lutaremos! Infelizmente, nossos maiores inimigos não estarão do outro lado do campo de batalha. Não, eles não estarão na oposição. Eles serão aqueles que estarão ao nosso lado nas trincheiras, nos dando tapinhas nas costas e minando tudo que tentamos construir até agora. Estejam preparados. Guardem bem isso. Lembrem do que estou dizendo hoje, dia 10 de dezembro de 2020.
Como viram, a luta é árdua!
Os conservadores precisam acordar para essa realidade!
P.s. As informações matemáticas sobre legislação eleitoral, quociente, coeficiente, métodos e sistemas eleitorais são de texto do autor Fernando Vaisman.
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